20100130

Fungo não enxerga felicidade em olhos alheios nem abraça muitíssimo forte.

Ainda não desvendei o que aproxima tanto a enxaqueca da minha sensação de felicidade, aquela que quase chega a névoa. Sendo que névoa é o sentimento, não o acontecimento. O que acontece é fosforescente e latejante.

São alguns fatos: a enxaqueca se esvai quando eu relaxo tanto que esqueço que ela estava ali; a enxaqueca se esvai quando a vomito do meu corpo, no caso dela estar tão latejante quanto eu; a enxaqueca se esvai quando puxo cuidadosamente o fio em que ela nasceu de dentro da minha cabeça para fora; ou ela simplesmente morre por conta própria, me deixando um pouco tonta, pálida e suscetível a desmaio.

A enxaqueca enxerga o que eu sinto quando estou muito feliz. Deve ser por isso que dói tanto. Ela consegue enxergar uma sensação muito forte através dos meus olhos. E isso, entendo que seja a minha relação mais próxima com ela. Penso que pode ser que ela seja realmente algo vivo, com coração, respiração e planos. Algo como um parasita que só cresce com choros, luzes, sons ou cheiros. Mesmo que sejam bons, tenho que lembrar. Amor e carinho a espantam de tal maneira que fico muitíssimo curiosa dela me fazer enxergar a sensação de felicidade!

O esquisito é que quando eu vejo a felicidade ela aparece, mas se eu resolvo chorar de tristeza, ela dói muito mais, como se choro fosse o alimento dela. Quer dizer que ela nasce, seja lá de que maneira for, e me faz ver o que sinto quando estou muito feliz. Mas se acaso eu chorar de tristeza, ela é alimentada e cresce rapidamente. O que ela quer de mim, afinal? Alegria ou tristeza? Ela pode até nascer com tensão ou irritação, mas, não que eu me lembre, ela nasce com tristeza. Só cresce, como eu disse. Ninguém nasce de alimento, não é mesmo? Só fungo. Uma coisa, então, é certa: a enxaqueca não é um fungo.

Pensei outra coisa: possivelmente a enxaqueca não tem olhos, já que ela aparece pra ver a felicidade pelos meus! Mas ainda encasqueto porque ela vê a minha felicidade. Será que a felicidade da enxaqueca é a mesma que a minha? Mas por que dói, então? Talvez ela não veja a minha felicidade, talvez seja mesmo a dela, porque dói. Ou ela intensifica tanto a felicidade que dói, como aquelas pessoas que de tão forte que abraçam, esmagam a gente. Talvez ela esteja só me abraçando muitíssimo forte.

Lembrei que ela raramente nasce quando estou muito feliz, mas de repente me faz ver a minha felicidade. Talvez seja esse "choque", do motivo que a faz nascer com a felicidade intensa que ela me faz ver, que dói.

O pior é que não sei como lidar com ela, só o vômito. Ou o vômito é uma espécie de super herói e tira ela de mim aos gostos ruins, ou ele é a própria enxaqueca, amarga e incansável. Geralmente eu choro quando eu vomito, mas quando eu vomito, a enxaqueca não cresce. Talvez o vômito seja o lado doce da enxaqueca, mesmo amarga.

Tenho que dizer que ela provavelmente seja a companhia mais paradoxal da minha vida, a que eu quero mais distante de mim possível, mas a que me faz enxergar como a vida é feliz sem ela. Mesmo que ela enxergue por mim a minha felicidade traduzida, enquanto dói.

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