20081223

Pro mundo todo um sol bem sorridente
que no meio dos dentes tem uma semente
com um pouquinho de algodão
embebido em água de açafrão
pra crescer um verão menos quente!

20081221

in(certeza): caminhar

1os caminhos incertos são mais __l__o__n__g__o__s__
2todos os caminhos são iNCerTos
3as incertezas estão todas no mesmo caminho~~~~~~~~

leyla

leyla é vazia antes do almoço e cheia depois. só pára em pé cheia de comida. vazia, leyla não pára quieta porque está a se esvaziar das palavras. quando leyla está vazia, ela fala. quando leyla está cheia, ela silencia. leyla almoça palavras de comida para parar em pé. e na fala de novo se esvazia, pois já está noutro dia.
Eu quero mesmo é viver nos meios,
aqueles que de névoas são cheios
como o travesseiro onde entrei ainda à pouco
que nem disfarçou este mundo louco:
que mistura pessoas lindas com fatos feios!

[leu luio)


m e i o c h e i o
m e i o l e i g o
t e m r e c h e i o
s e m r e c e i o
m e i o m e i g o
[ l u i l e u i o )

eu, mundo e fim (ou filme)

eu vou aprendendo que o tempo é uma coisa louca mesmo. depois que vi o homem vendo sua própria morte enquanto menino pensei em duas coisas: 1quando eu encontro pessoas na rua, pessoas desconhecidas, uma delas pode ser eu mais velha ou eu mais nova, ou as duas coisas, ou várias delas, ou ainda eu de outras maneiras por viver em épocas culturalmente e de espíritos distantes 2uma hora ou outra pode ser possível eu pegar um caminho para onde nunca fui? e então não me encontrar na rua ou em outros lugares em outras épocas e conhecer pessoas que nunca conheci e me apaixonar por isso de estar sozinha e longe até de mim mesma?

que coisa estranha é esta das pessoas estarem sempre presas aos blocos da vida... eu ando e penso que as pessoas são só da minha cabeça. é, mais ou menos isso. se eu resolver mudar a minha cabeça as pessoas vão mudar também. e eu vou ser aquela outra-eu que esbarrou em mim enquanto eu caminhava no super-mercado procurando o iogurte perfeito para o dia de hoje. parece uma coisa meio egocêntrica dizer que eu me encontro por aí nas outras pessoas. mas a verdade é que as coisas são egocêntricas. e alguém consegue pensar no outro sem se colocar no lugar dele? numa dessas somos todos a mesma pessoa em fases da vida diferentes.

eu gosto de experimentar raízes. não só raízes amargas ou adocicadas ou salgadas. às vezes eu gosto de pensar só nas texturas. mas o que eu gosto mesmo é de procurar raíz que não tem fim. aquele tipo de raíz que termina só depois do fim das pessoas. o meu fim é menos e o fim da raíz é mais. e o mais legal de tudo é saber que alimentando a raíz ela vai crescendo e acaba ficando maior que todo mundo junto. é difícil de acreditar, eu sei. mas tudo depende do objetivo quando se está experimentando. quando a textura é boa mesmo o meu objetivo é não alcançar o fim. mas mesmo que eu alcance eu faço de conta: ah, que fim você acha que é pra já ir chegando assim?

elogio à preguiça

Já me chamaram de bicha-preguiça
mesmo eu não comendo lingüiça.
Sonhei até em dormir para sempre,
mas nem aconteceu que eu me lembre...
Lingüiça é língua que enguiça?

20081219

Tô tetris tô triste
por que sorriste?
Nem prestas nem sol,
falei pro caracol:
ainda bem que sumiste.

grávido caminho grave

cada passo era mais devagar que o último. quase parei. mas voltei a andar fazendo mais pressão contra o chão. diminui a velocidade de novo. bem devagar. bem devagar mesmo. diminui devagar e aumentei com pressão. a pressão servia pro caminho ficar mais macio. e grave.

o caminho ficou tão longo. a rua ficava cada vez mais comprida. parecia que quanto mais eu andava mais longe de casa eu estava. como um sapato que era novo e ficou velho. laceou. esta é a palavra certa para rua de hoje. laceada. eu andava e laceava a rua. e ela ficava longe até dos meus pés.

os meus movimentos estavam tão lentos que eu percebi coisas que nunca tinha percebido. vi uma casa que não tinha telhado na frente. atrás a casa o tinha. pisei devagar e respirei rápido. ela era algo novo e pedia para eu tratá-la de maneira diferente das outras vezes. eu caminhei um pouco mais rápido. contrastei com a pisada lenta. pisei lento como se não tivesse gravidade.

o caminho estava grávido de passos lentos e pisadas fortes. e depois pisadas leves. e então fortes. e então leves. leves como dançar balé de um jeito livre. o pica-pau dançava balé de um jeito livre na minha cabeça enquanto eu via o mapa da áfrica no meu vômito. mas esqueci de me concentrar no gato que saiu por trás do lixeiro. lembrei que o caminho teria muitos passos ainda pela frente. mesmo grávido de coisas graves. ou leves. ou fortes. o caminho estava parindo os meus passos.

esse caminho estava anoitecido por horas. amortecido. laceado e amaciado.

desse caminho nasceu também uma barata gigante. a barata estava me esperando em casa. já entrei com passos que pressionavam o chão contra o mundo. a barata se escondia e me enganava. eu jurava que ela tinha entrado no cesto da roupa suja. e isso era a coisa mais horripilante que podia acontecer. pior que tirar pica-pau dançando balé da cabeça.

não! o caminho me trouxe para conhecer uma barata não tão covarde assim. ela não daria um golpe tão baixo em mim. ela passeou com passos leves e fortes e outra vez leves e outra vez fortes pela casa. o banheiro foi o mais pisado. ela foi por cantos e por lugares estreitos e duros. eu procurava a maldita sebosa e ela fazia questão de não aparecer. até que eu resolvi buscar a vassoura para me auxiliar junto com o chinelo. ele não saía por um segundo da minha mão.

antes de buscar a vassoura e me distanciar do local do crime eu verifiquei que a monstrenga estava atrás da minha caixa com o quit para depilação. e saí rápido para voltar rápido. mas quando voltei, não! ela não estava mais por lá. fiquei tempos olhando. ela passou então suas gosmentas antenas por baixo da porta. ela tinha esperanças que eu não sabia onde ela tinha se metido. metida.

foi, então, que a insolente achou que aqueles passos rápidos iriam adentrar o meu quarto cheiroso e virgem de pisadas nojentas? aquele momento era a minha chance. confesso que foi horrível. minha primeira vez se preencheu de muitos golpes. nem tão certeiros assim. eu não queria que ela sofresse, mas eu não tinha outra maneira de vencê-la. ela estava no meu território. não era minha a culpa. espero que a família dela ache que ela foi viajar e nunca mais voltou. ela foi para a áfrica. ui.

20081205

[eu me desdobro]

procurei procurei procurei: vidafranzida. e lá eu frazirei de maneiras mais ou menos franzidas de vida.

a paula apalpa e lava as palavras e as larvas

pal avras
pau la
lar vas
pau la
lar vas
pal avras
pau lar
la avras
pal vas
la vas
pal avras
pau lar

20081202

casa, coisa, mundo, chuva, alma, fome e sede

o mundo está faminto. e come. é isso que eu vejo nas notícias: o mundo comendo as casas e as pessoas. o mundo comendo a alma das pessoas que roubam as pessoas que chovem por dentro. a terra do mundo ficou mais macia. ficou tão macia que ficou apetitosa. o céu não a quis mais seca. e então a terra desabou dentro do mundo. dentro de todo mundo. em cima das casas e das coisas. o mundo não pára de ter fome de terra. a terra está se comendo. e a terra vai sumir dentro dela mesma. assim como as pessoas que estão desabadas. e desalmadas. porque as pessoas se dividiram em duas. as que querem as coisas e as que querem as casas de volta. o mundo está para secar a água toda. o mundo há de ter sede. e há de beber essa água e deixar a terra seca de novo. e deixar os olhos das pessoas secos também. e as almas? as almas já estão dentro do mundo. as almas o mundo não vomita mais.