20081031

fio-farpado

Não adianta acabar com ela, ela não vai, ela nunca vai (nunca mesmo!). A única coisa que ela vai é estar sempre ali, esperando um fio de memória, e desta vez, então, ela vai puxando e puxando até arrastá-lo com ela. Ela puxa forte. Tão forte que arranha. O fio é arrastado por onde ela quiser. Pelo corpo todo se ela quiser. Faz doer o que achar melhor. É como se fosse farpado. Um fio-farpado. Uma memória-farpada. Que está e estará ali ainda depois. Grudada. Mesmo que ela seja escondida, ela não morre e não evapora. Ela é de fio grudado (como eu disse antes: grudado, grudado e grudado). Um fio grudado e farpado. Grudado em todo resto. Mas mesmo assim, falando meio pra dentro, um dia poderá existir um jeito de dissolver farpas. Ou mesmo escondê-las ou transformá-las. Usar-se delas como ponte ou base. Algo assim. Ou alguém.

suma!

Acordo lá pelas tantas da madrugada, arrasto meu sono até o banheiro e tomo um banho de começo frio com fim morno, arrumo meu cabelo devagar até parecer bonito ou desarrumo meu cabelo rápido até parecer bonito, corro para quase perder o ônibus e me esmago entre as pessoas: uns olhares pra cá, outros pra lá, algumas curvas enjoativas, pensamentos e pesamentos na cabeça: cliques, muitos cliques pesados à mão livre: a tua presença na minha cabeça pesa e a minha cabeça pende prum lado e depois pende pro outro, ela fica em movimentos de quase-cair: eu a vejo cair e rolar entre os pés de cada um que pensa, mas não com os pés: em coisas que não são ditas, em coisas que não são ditas mas poderiam ser e em coisas que foram ditas, que são ditas ou que serão ditas (as vezes ali mesmo pra algum outro pensante-pesante): de jeito irritante e ininterrupto: tua presença na minha cabeça: sendo tu algo e não alguém: vegetal e não-humano, comível (palpável) e não-poupável: nada que não se possa criar em qualquer lugar (assim como fungo) ou se achar criado por luz alguma ou por sombra: por todas as vezes dispensável e invisível: essa tua mais querida fase-vapor desmaiada em mim: (ela é tua, mas fui eu que ventei dentro).

20081028

por subir e morrer o dia todo

por subir o morro todo dia
por subir eu morro o dia todo
por morrer eu subo todo dia
por subir o dia eu me morro toda

20081018

o soluço é o início da solução

Corpos em cacos costumam conversar
mesmo quando estão a se dispersar,
pois contam com latas de moça fiesta
pra grudá-los todos através da fresta
e adocicá-los sem mais nada precisar.

20081016

(estou desistida) um texto mal escrito prum contexto mal escrito:

É_SEMPRE_RUIM_________
ser bom é ruim/ser ruim, é claro (é claro por quê, né?), é ruim/equilíbrio é mais que ruim: é perfeito/ser perfeito é péssimo/----ascoisasnãotêmpaz-----/ser um ser é um saco/é mais que um chá de tão saco: ser-ser(!) (duplamente um saco)/é mais que um saco: é um saquinho! (quer mais saco que diminutivo de saco?)_________
SACO, RUIM E PERFEITO são todos dos infernos dos quintos.
De repente o sexto dos infernos seja menos que tudo isso... E isso, talvez, seja o que tem de bom: SER MENOS
MAS se ser bom é ruim, tudo deve ser sempre duplo de saco-------saquinho (afe!)

É, acho que é isso: as coisas vivem em saquinhos.
E os saquinhos vibram de pele de membrana quando as coisas são faladas (ou berradas! berrou?).
SÃO SAQUINHOS DE MEMBRANA CHEIOS DE CERA.
----------falar_é_comer_cera_involuntária------------------------------------

20081014

oi et, mora comigo?

vou morar dentro da geladeira, da vaca, da geladeira, da vaca, do leite da vaca, do iogurte, do almoço de ontem, do suco de uva, da luva, da chuva, do gelo, da fronha, do puLO, do sOl, do céu, da nuvem, da névoa, do sono, do bocejo, da cama, da lama, do gel, da geléia, da geladeira, do gelo...

20081012

Vi por aí uma alma sem dono,
rastejando triste com cara de sono.
O que lhe faltava era o corpo teu:
a casa que um dia me comeu
como qualquer bolacha bono.

20081003

Quando voltei pra casa passei por largos labirintos,
e olhando pra fatia de lua estive em pensamentos sucintos:
quase transparentes de tanta gentileza,
que lá por dentro fizeram eu não me sentir presa,
mesmo que o caminho me levasse pro inferno dos quintos.
Acontece que agora sei o que escolher,
porque até a alma tem cabeça pra perder.
E mesmo com o professor ali girando,
eu fiquei horas e horas pirando
pra ver a água da cabeça ferver!